No tempo das amoras tudo pode acontecer.

8 de dezembro de 2011

desculpem

Peço desculpa pela interrupção.
Logo que possível irei retomar a história. E com novidades e desenvolvimentos. Prometo ser breve.

26 de abril de 2011

confronto

-Miguel,  diga-me que já sabem do meu filho...
-Não. Não encontraram o seu filho. Segundo o comandante o fogo começou no escrotório e felizmente chegaram a tempo e conseguiram controlar as chamas e estenão se propagou muito.
-E o Jorge? Tem de estar em algum lado!
- Os bombeiros estão a procurar.Vão ver se entretanto não está abrigado do fumo em outra parte da empresa.
-Vou falar com o meu pai.
-Não vás Rosa. O que o teu pai sabe é o que eu te disse, confia em mim.
-Deves estar a brincar... Achas que estás em posição para me pedir para confiar em ti?!
-Não confundas as coisas.
-Se há alguém a confundir as coisas és tu, aliás nem sei porque raio tu estás aqui!
-Porque a tua mãe me pediu.
-Importam-sede parar com isso? Rosa devias estar preocupadacomo teu irmão. E não com essas coisas triviais.
-Triviais para si mãe, que ainda não sabe da história nem a metade.
-Nem me interessa agora Rosa. O mundo não gira à tua volta filha, neste momento importa-me o teu irmão.
-Tem razão mãe, desculpe. Vou ter com o pai para saber das novidades.

23 de abril de 2011

o incêndio

Pegaram nas coisas à pressa e saíram as duas a correr. Pelo caminho Rosa tentou ligar aos pais mas estes.não atenderam.
A confusão è volta da fábrica era tal que não se conseguiam ouvir os telefones. Sabiam que elas estavam de volta e por isso preocuparam-se com outras situações como descobrir o Jorge.
O irmão de Rosa tinha dito aos pais que ia escritório da empresa, não disse o que lá ia fazer, disse simplesmente que não devia demorar. Cerca de meia hora depois recebiam o telefonema de um vizinho a dizer que o escritório da empresa estava em chamas, os bombeiros já haviam sido avisados mas era melhor irem para lá.
Quando chegaram à empresa os pais de Rosa encontraram um cenário Dantesco. Carros de bombeiros e gente porto do lado, fumo e nem sinal do Jorge. Ligaram de imediato ao Miguel, ele sabia como ajudar numa situação destas. Foram falar com o comandante, explicaram que eram  proprietários e que se o carro do filho estava cá fora, provavelmente estaria nas instalações. O medo tomou conta dos pais de Rosa e Jorge.
Miguel chegou acompanhado de João e nem queria acreditar quando viu o carro do cunhado à porta e a empresa em chamas.
A Mãe de Rosa agarrada a uma amiga ansiava por notícias de ambos os filhos.
Rosa chegou na fase quase de rescaldo.Viu a sua mãe em prantos e foi a amiga que lhe explicou que não sabiam do Jorge.

-Ai Rosinha minha querida isto é uma desgraça. E o seu paizinho e o seu marido foram com o comandante ver se sabiam de novidades. Graças a Deus que pelo menos o lume já parou.
-O Miguel está cá mãe? - A mãe acenou que sim.

Miguel veio ao longe,com João e pela cara não tinha boas novidades...

20 de abril de 2011

A noite

O jantar tinha sido de facto fantástico. E o Zeca sabia bem como distrair a amiga. A noite foi passada de forma muito agradável e Rosa quase tinha conseguido esquecer-se de como estava a sua situação. Quase tinha conseguido distrair-se como numa noite normal.
Chegaram a casa pelas onze da noite, Maria reparou que com a confusão ambas se tinham esquecido do telemóvel e não o levaram para jantar.

-Olha esqueci-me do telemóvel e tu também, devo ter imensas chamadas! Ui... Eu tenho duas mas tu tens... 21!
-Quantas? Deve ser a minha mãe, já deve saber de tudo, é uma sorte não ter vindo por aí a cima. - Rosa pega no telefone e confirma a origem das chamadas - Vês? Tudo da minha mãe, do meu pai e do Miguel.
- Sim, era previsível, não era melhor ligares à tua mãe para ela ficar mais calma?
-Não consigo Maria, ela vai já colorir o filme à maneira dela. Não estou com cabeça.
-Tu é que sabes, olha vou só ligar ao meu marido se não daqui a pouco quem faz filmes é ele. 

Rosa deitou-se no sofá da sala a olhar para o telemóvel, será que devi ligar à mãe? De facto a mãe devia estar preocupada, mais tarde ou mais cedo teria de lhe ligar.
 Maria entrou na sala branca e com o telemóvel ainda na mão.

-Rosa, não vais acreditar no que aconteceu. Afinal não era para saberem da tua vida que tinhas essas chamadas todas.
-O que foi mulher, que se passou então?
-Um incêndio. Houve um incêndio na empresa do teu pai.
-Um incêndio? Mas não há nada mais que me aconteça por estes dias?
-É melhor irmos para baixo Rosa.  
-Mas não está controlado? Deixa-me ligar ao meu irmão primeiro.
-Há mais Rosa...
-Mais? Como assim?
-O teu irmão... O João disse-me agora que não encontram o Jorge...
-O quê? Não encontram como? Ele estava lá?
-Não sei...O João também não sabia. Acho que ninguém sabe. É melhor voltarmos Rosa.
-Vamos. Vou ligar ao meu pai pelo caminho...

18 de abril de 2011

jantar

-Não demos pelo passar das horas, desculpa Zeca.
-Não faz mal, ainda temos tempo. Já sei como são as mulheres marquei só para daqui a 40minutos.
-Ah ainda bem! Vamos só vestir os casacos lá acima ok?
-Ok, isso é como quem diz "em meia horas estamos prontas".

Todos sorriam, sabiam que era completamente verdade.
Zeca levou-as a um restaurante de um amigo de infância de ambos. Depois de casar, decidiu abrir juntamente com a mulher um restaurante moderno, algo que realmente faltava na zona. O espaço era encantador, sempre com uma música de fundo estilo lounge  e uma cozinha super moderna. Estava repleto de casais novos e a ementa era deliciosa.
Rosa optou por um folhado de aves acompanhado de uma salada de rucúla com molho de vinagre balsâmico. Maria que sempre foi louca por massa escolheu um spaguetti nero com molho de tomate e camarões salteados. Zeca pediu o de sempre, secretos de porco preto com batata a murro e ervas aromáticas. Como não podia deixar de ser o vinho foi escolhido por ele e personalizado de acordo como pedido de cada um.
Sempre deu muita importância ao vinho. O aroma frutado era para ele o verdadeiro segredo para fazer de qualquer cozinheiro um chef por excelência.
A comida estava deliciosa. E a verdadeira intenção de Zeca estava a ser conseguida. Rosa tinha conseguido esquecer por minutos o caus em que se havia tornado a sua vida. Não falaram nunca, até altura da sobremesa do que havia acontecido. Ela precisava de respirar, foi esse o principal motivo que a levou a Cerveira. Zeca sabia disso.
A sobremesa foi escolhida pelo dono do restaurante, como oferta para relembrar a infância, e antes de os deixar fazer qualquer pedido, veio mousse de amoras sobre telha de amêndoa com toque de chocolate quente. Rosa não conseguiu conter as lágrimas o Miguel adorava mousse de amoras. Em tempos chegou a comprar amoras congeladas,em pleno inverno só para lhe fazer uma surpresa no aniversário. Ainda por cima estava deliciosa.

15 de abril de 2011

sábado

A manhã de sábado passou-se num ápice. O sol da manhã convidava a sair e as amigas não contrariaram a vontade. Foram ao mercado onde compraram algumas coisas para fazer um almoço leve e logo de seguida saíram para dar uma volta pela propriedade.
A quinta era grande.  Além da casa da Rosa e a do caseiro, havia ainda a casa de dois tios, a adega que era grande e a eira tudo rodeado por vários hectares de árvores de fruto, terra lavrada e um  pequeno pinhal. Estava tudo incrivelmente tratado e o ria como pano de fundo dava à propriedade uma imagem bucólica belíssima.
Os aromas que pairavam no ar remetiam Rosa à infância, cujos Verões havia passado naquela propriedade.

-Passei aqui tempos muito bons... Gostava de um dia poder ter aqui os meus filhos a correr e gostava que eles fossem tão felizes aqui como eu fui.
-Hás-de conseguir isso tudo Rosa.Vais ver. E mais, também quero ter miúdos meus a correr por aqui, estes ares dão mesmo saúde.
-Apesar do Miguel não gostar de estar cá muito tempo, passei momentos bem bonitos com ele aqui. Fizemos muitos planos aqui enquanto éramos namorados.
-Recordar é bom Rosa.
-Como é que isto foi acontecer logo comigo? Tinha tudo para ter uma vida calma e feliz...
-Isto foi um percalço, as coisas vão mudar.

À medida que se aproximavam da casa viam no alpendre Zeca, que se encontrava já à espera das duas amigas!

-É verdade, o Zeca...Nunca mais me lembrei. Que horas são Maria?
-São quase oito...É pontual o homem!  Nem dei pelo passar das horas. Vamos lá então comer alguma coisa de jeito, finalmente.

14 de abril de 2011

-Então o teu amigo já se foi?
-Sim já foi, convidou-nos para irmos jantar logo. Diz que conhece um sitio.
-Acho muito boa ideia! Mas agora vá salta para o banho e veste qualquer coisa que temos de ir comprar qualquer coisita à tasca mais próxima.
-Maria... é mercearia! A tasca vende vinho!
-Eu sei, era só para pegar contigo. Vá senta aqui ao pé de mim, vamos à tasca depois, vamos conversar dois minutos.
-Não sei se me apetece Maria.
-Pensaste durante a noite?
-Não fiz outra coisa, mas não cheguei a conclusão nenhuma. Cada vez isto me parece uma espécie de pesadelo, a qualquer momento penso que vou acordar. Hoje quando acordei parecia que isto era outra vida...
-Vais ter de pensar no que queres, se queres continuar com o Miguel, Rosa apesar de tudo o Miguel gosta de ti, e tu sabes isso melhor do que ninguém.
-E quem ama faz uma coisa destas? Maria pensa bem, a Carla era minha amiga.
-Pode ser tua amiga mas bem sabes que nunca foi uma pessoa muito séria, sempre vi nela alguém de pouca confiança, sempre te disse isso. Mesmo lá na empresa sinceramente, não tenho nada a ver com isso mas acho que lhe dão espaço a mais.
- O meu irmão confia muito nela. Ele sempre foi apanhado por ela, então não vê certas coisas.
-Ela não é uma pessoa equilibrada Rosa, pode ter sido muito tua amiga mas isso não faz dela boa pessoa. Nunca achei que fosse. Já lhe conheci imensos relacionamentos, nem tem conta, bem sabes que ela não se importava muito se eram casados não, e além dessa instabilidade relacional tem a componente psicológica. Então não vês quando andava fixada que andava uma mulher atrás dela só para lhe copiar toda a roupa que trazia? Isso não é de uma pessoa normal.
-Vai a ver-se e andava mesmo uma mulher atrás dela, devia ser mulher de alguém com quem ela andava metida a ver se lhe acertava o passo.
-Pois, até aí também não duvido.
-Mas não consigo perdoar o Miguel. Ele sabia muito bem o que estava a fazer, ela não o obrigou a nada. E a verdade é que quem me deve satisfações é o Miguel, não é a Carla. 
-Não acho que devas tomar decisões assim a quente, nada é definitivo.
-Vou tomar banho. prepara-te, vamos à tasca.

Rosa subiu a escada a sorrir, a amiga tinha razão, nenhuma decisão devia ser tomada a quente mas sabia que não conseguiria perdoar o marido. O golpe tinha sido muito profundo. Demasiado profundo. E pensar que nem 24 horas tinham passado. Como estaria o Miguel? Será que já tinha saído de casa de ambos? Esperava que sim.

10 de abril de 2011

Zeca

-É ainda muito cedo para poder pensar tão pouco, ainda nem acredito no que aconteceu, por isso custa-me estar a contar-te logo estas coisas. Já não falo contigo há tanto tempo...
-Rosa por favor, conheço-te desde sempre, não é por não falar contigo há uns meses que deixo de te conhecer. Crescemos juntos, acho que me podes contar o que se passa.
-Em parte foi a confiança que me tramou...
-Não estou a entender nada Rosa, em quem confiaste que não devias? Foste burlada?
-Sim, em parte fui. Pelo Miguel.
-O Miguel burlou-te? Bolas Rosinha fala claro por favor.
-O Miguel, meu excelentíssimo marido decidiu que estava na altura de me trair, e como se não bastasse decidiu fazê-lo com uma das minhas melhores amigas.
-Quem?
-A Carla?
-A que trabalha na empresa do teu pai?
-Yep, essa mesmo.
- O Miguel? Nunca pensei... Como descobriste?
-Pela Internet, ou seja da melhor maneira...
-Não há melhores maneiras de descobrir essas coisas. Quando foi isso?
-Ontem.
-Mas o Miguel esteve cá ontem...
-Sim, veio desculpar-se. Não há desculpa possível como deves compreender.
-Rosa tens  uma vida pela frente, vocês estão casado há pouco tempo.
-Estávamos Zeca, estávamos. Achas que vou ser capaz de perdoar uma coisa destas?
-Não sei Rosa, estás com a cabeça muito quente é tudo muito recente.
-Não Zeca, não vou conseguir, ainda por cima com a Carla, é caso para dizer pior era impossível.
-Tudo te parece tenebroso agora, vais ver o tempo relativiza as coisas. Pensas ficar aqui muito tempo?
-Volto amanhã para o Porto, tenho o meu trabalho, não me posso dar ao luxo de faltar, tenho um projecto importante em mãos ainda por cima...
-Só te posso dizer para aproveitares bem o fim de semana, se quiseres vir ao fim da tarde dar uma volta pela quinta diz qualquer coisa. E pelo que vi o jantar não vai ser fácil com aquele frigorífico vazio, por isso estás convidada mais a tua amiga para virem comigo ao restaurante de um amigo meu. É um espaço novo moderno e muito calmo, pomos a conversa em dia, aproveito e conto-te um bocadinho de mim também...
-Vou falar com a Maria...
-Ela vai querer de certeza, agora tenho de ir, vou ajudar o meu pai com as uvas, vou ver a maturação para saber se pode ou não colhe-las em breve. Até logo Rosa... descansa.
-Eu não sei se vou Zeca...
-Às 8 estou cá... beijo

8 de abril de 2011

amanhecer

O dia estava magnífico. Os primeiros raios de sol entravam pela sala e fizerem Rosa levantar-se de imediato. Como era possível, um dia tão lindo em contraste verdadeiro com o que ia no seu coração. Nem queria acreditar em tudo que tinha acontecido, parecia tudo um sonho mau. Sabia que não era, apesar da realidade parecer má de mais a verdade era aquela. O seu marido de sempre havia-a traído com a sua melhor amiga. Como tinham sido capazes? Rosa era forte e sabia disso mas naquele momento o seu coração estava mais apertadinho que uma noz. Dirigiu-se à cozinha onde a amiga já se encontrava a tentar improvisar um pequeno almoço.

-Rosinha isto aqui não há condições darling! Não me apetece muito comer bôla de carne logo ao acordar mas tinhas aqui uns pacotes de leite e estas bolachinhas, nada mau para começar...
-Deixa lá, também não me apetece.
-Oh outra vez essa conversa Rosa. Por favor. Já sabes que tens de comer. Vamos lá comemos agora isto e depois vamos às compras à vila. Mais nada! Não é negociável.

Rosa sorriu. ao mesmo tempo a campainha tocou, que seria àquela hora?
-Deixa-te estar que eu vou lá ver- Maria encaminhou-se para a porta ainda a rir-se do pequeno almoço que havia preparado para a amiga.- Sim?
-Olá outra vez! Dormiram bem? A minha mãe lembrou-se que não deviam ter pão e decidiu enviar-vos uma pão e umas compotas...
-Bem, mas tu estás sempre na hora certa com o que é preciso Zeca!
-Pois... Peço desculpa mas não me lembro do seu nome...
-Não tem mal, eu não me apresentei ontem... Maria. Desculpa lá mas ainda estamos assim desgrenhadas, acordámos à pouco...
-Não faz mal, eu aqui acordo sempre cedo, as horas da manhã são sempre as melhores no campo. A rosa´, está melhor?
-Que disparate entra... aproveitas e tomas o pequeno almoço também... Agora sim, temos pequeno almoço... Rosaaa!

Rosa tinha ouvido a voz do Zeca, e esperou que ele não entrasse, sabia que ele a conhecia muito bem, ia perceber que algo estava errado. Ele entrou, estava curioso em rever a amiga de infância.

-Rosa querida... como estás?
-Tudo bem Zeca? Já não nos víamos há algum tempo.
-Bem vou deixar-vos à conversa porque tenho mesmo de tomar um banho para acordar, não consigo comer essas iguarias desse cabaz magnífico se não tomar um banho primeiro... Portem-se bem sim? - Maria piscou o olho à amiga nas costas de Zeca, sabia que uma conversa assim franca era capaz de a animar.
-Parece-me que as coisas não estão assim tão bem... Não está com cara disso.
-É uma longa história Zeca.
-Tenho tempo. A tua amiga também tem ar de quem vai demorar no banho.

A conversa ia ser longa! Rosa inspirou fundo....

6 de abril de 2011

sexta

Em casa, o telemóvel do Miguel não parava de tocar. As mensagens caíam quase ao segundo Miguel lia-as todas na vertical, não prestando muita atenção. Eram todas da Carla.

-O teu telefone não pára!
-É a Carla. Está completamente louca.
-Mas que quer ela?
-Começou por dizer que não é justo para ela também, que eu a usei, agora já me disse que se vai demitir, olhe sei lá que se passa naquela cabeça.
-Convenhamos que também é capaz de não estar a ser fácil para ela.
-Acredito que não. Mas eu não consigo pensar nela agora. Chama-me egoísta se quiseres mas não consigo.
-Está tudo muito a quente, ela também não devia estar já a pressionar-te assim.
-Eu não chamaria pressionar, ela está mesmo a ameaçar-me. Queres ler?

As mensagens eram realmente estranhas, nas últimas mensagens podia ler-se:
"Eu demiti-me mas já sabes que não vou sair da empresa, nesta história toda, quem vai dançar és tu"
"A tua rosinha ainda vai ter muito que temer, se pensa que fiquei por aqui, se fosse a ti pensava melhor se não queres ficar do meu lado."

-Cruzes meu, esta mulher está louca!
-Sim, acho que ela perdeu um pouco a noção da realidade e pior de tudo é bem capaz de fazer alguma estupidez.
-Que ela era meia aluada já sabia agora assim...
-Nas que eu me fui meter... olha vou beber um whisky, queres um?
-Nem penses, a esta hora só se for um leite morno com chocolate, o meu estômago já não é como dantes, estou a ficar velho!
-Estamos amigo, estamos.

O telefone de maria tocou exactamente às três da manhã, sobressaltada quase caíu do sofá e pior ficou quando viu que não conhecia o múmero.

"Se achas que vou deixar isto fácil para a "nossa flor", estás enganada, podes dizer-lhe que pode desligar o telefone ou até mudar o número dá-me no mesmo, ela vai ter de me enfrentar"
quando Maria se preparava para responder, era certo que seria com um insulto, Carla desligou.

5 de abril de 2011

As noites em Cerveira arrefeciam verdadeiramente, contrastando com o calor que se fazia sentir durante todo o dia.
As duas amigas enroscaram-se numa manta e puserem-se à conversa no sofá da sala. A televisão praticamente não apanhava sinal.

-Amanhã tenho de ir falar com o senhor Manuel para ver se ele me arranja a antena. Certamente com o vento deslocou-se. Assim nem televisão podemos ver.
-Se eu fosse a ti pedia antes ao filho. Ele mostrou-se tão prestável.
-Não comeces Maria! Vais tentar cansar-me com esse assunto!
-Oh lá estás tu a levar para onde não deves! Eu só disse que era melhor falar com o filho porque é mais novo. O senhor Manuel já não tem idade para andar a subir assim aos telhados.
-O Zeca não é cá funcionário, não tenho de o chatear com esses assuntos da propriedade.
-Pronto está bem... Mas já agora ele é casado?
-Não. Ele namorou durante algum tempo com uma miúda cá da aldeia. Estudaram os dois em Bragança mas terminaram pouco tempo depois de ele ter ido para o Douro.
- E porquê?
-Olha que tu tens cada uma! Sei lá eu porque é que acabaram. Achas que é assunto que eu aborde? Já nem me lembro de o ver quanto mais falar dessas coisas.
-Não me lembro dele no teu casamento.
-Ele não foi. Não estava cá na altura. Estava em Itália a fazer o mestrado. Tem uma tese sobre um vinho lá da Sicília acho eu.
-Parece-me muito bem sim senhora. E parece-me um desperdício o rapaz não ter namorada!
-Eu não disse que ele não tinha namorada, só disse que não conhecia.
-Amanhã vou saber disso. Não olhes para mim assim, já sabes que sou curiosa, é só por isso.
-Maria que raio vou eu fazer à minha vida. Era nisso que devias estar a pensar, em vez de estares a gastar energia com tontices.
-Rosa estava apenas a distrair-te, a aliviar o ambiente amiga...
-Pois mas o problema está cá na mesma!

O telefone de Rosa tocou naquele momento.

-É o meu irmão! Que estranho que quererá ele? Estou, Jorge?
-Olá Rosa, estás bem?
-Mais ou menos, porque me estás a ligar?
- Porque quero saber o que se passou entre ti e a Carla. Acabou de me ligar a dizer que se demitia e quando perguntei o porquê ela disse para eu falar primeiro contigo...
-Óptimo, Poupa-me imenso trabalho.
-Rosa não aceitei a demissão, não posso aceitar... Ela não fez nada à empresa.
-Fez-me a mim, andou metida com o Miguel, andam os dois a enganar-me há imenso tempo.
-Como?
- É o que ouviste.
-... Rosa , está tudo a quente, Não posso demiti-la por questões pessoais.
-Não vais precisar de a demitir, ela despediu-se.
-Temos imensos projectos em mão Rosa, a Carla é fundamental neste momento, ela sabe muito sobre a empresa...
-Também eu sei muito dela...
-Rosa, sei que estás magoada mas vou ter de falar com o pai. Ele vai ter de decidir, bem sabes que eu não mando nada.
- Ok, fala com ele logo vês o que ele diz.
-Tu estás onde?
-Em Cerveira, mas por favor não lhe digas que estou aqui. Estou com a Maria, estou bem, e ele por favor que não diga nada à mãe, quero falar com ela pessoalmente. Com o pai também, mas como esse assunto me parece pendente... adianta só o que precisares.
-Também não sei muito, não posso adiantar muito.
-Depois falo também contigo. Xau. Beijo
-Rosa se precisares de alguma coisa diz-me por favor... beijo.

-Já se despediu.
-Fez muito bem, pelo menos isso...
-Ela é muito esperta. O meu pai não vai aceitar a demissão dela, o Jorge encarrega-se de o convencer disso.
-O Jorge? Porquê?
-Vais ver... O Jorge é tolo pela Carla,bastava ela estalar os dedos...
-Pois...

As duas amigas aconchegaram-se melhor nas mantas e Rosa adormeceu enquanto as lágrimas lhe escorriam pela face. Não sabia por quem se sentia mais traída se pelo marido se pela amiga que sabia que agora lhe ia fazer a vida num inferno todos os dias.

4 de abril de 2011

show must go on

Maria caminhava para a sala com a bôla na mão e um sorriso tonto na cara.

-Olha, vieram cá trazer a bôla, ainda bem, pelo menos já temos alguma coisa para meter à boca e enganar o estômago. Já viste que estamos à imenso tempo sem comer?
-Não me apetece nada Maria, uma bola é o que eu tenho no estômago e um nó é o que tenho na garganta. Aquele senhor Manuel é um querido. Estão com a nossa família desde sempre.
- Tens uma família muito agradável então. Quem veio trazer cá isto não foi o senhor Manuel, foi o filho, um moreno todo interessante e interessado! Disse que estava ao teu dispor porque sabia que tinhas medo de estar cá sem o Miguel.
- Está cá o Zéca? A sério? Ainda bem que não fui eu quem foi à porta. Conheço o Zeca desde sempre. Crescemos juntos, brincamos juntos.
- Ele ainda mora cá?
- Não! O Zeca é Enólogo. É responsável por uma marca de vinhos conhecida. Eu não percebo nada disso, sabes que detesto vinho, mas ele tirou essa licenciatura e pouco depois foi para o Douro trabalhar. Só cá vem de vez em quando.
- Parece-me muito bem. - Maria esboçou um sorriso maroto enquanto partia com a mão um pedaço daquele manjar.
-Não te ponhas com ideias. Já te conheço e não é de hoje. O Zeca é um querido mas já nem me lembro de o ver. Importas-te de te focar no meu problema e não andar a tentar arranjar-me outro problema?
- EU?! Que coisas pensas tu de mim amiga... mas sabes como diz a cantiga... show must go on.
-Deixa-te disso Maria. Dá cá então um pedaço disso que o cheirinho abriu-me o apetite.
-mhhh foi só o cheiro?
- Mau!!

Enquanto as amigas conseguiam um momento de distracção na quinta, no carro a viagem de regresso ao Porto fazia-se de forma complicada. Miguel estava catatónico no banco do pendura e João não sabia o que fazer, o que dizer e muito menos para onde o levar.

-Ficas em minha casa hoje meu.
-Não posso, tenho o fim de semana para tirar as coisas de casa, a Rosa foi bem clara.
-A Rosa está magoada pá. Querias que te dissesse o quê? Querias que te dissesse para deixares tudo para lá e que não se tinha passado nada? Não pode.
-Ela não me quer ver mais à frente, conheço a Rosa.
- Não nos próximos tempos, mas deixa as coisas acalmarem um pouco. Hoje não vais nada para casa, a menos que queiras que fique contigo. Não estás em condições de ficar sozinho. Além do mais a minha mulher fica em Cerveira e eu não gosto de ficar sozinho na minha casa por isso olha, pensa que nem é por ti, é por mim.
- Se quiseres ficas então em minha casa mas eu tenho de tentar perceber lá a verdadeira dimensão desta confusão toda que ficou a minha vida.
- Combinado. Vou só a casa buscar um kit básico de sobrevivência. Queres parar para jantar?
- Se quiseres parámos mas eu estou sem fome.
- Seguimos então, assalto o teu frigorífico no Porto.

2 de abril de 2011

em casa

Do outro lado da quinta Maria encontrou o seu marido.

-Então também cá estás?
-Sim, o Miguel apareceu lá em casa todo transtornado à procura da Rosa e depois disse que vinha para cá. Não o podia deixar vir a conduzir assim! Vinha completamente maluco.
- E não é para menos! Sabes o que ele fez à Rosa?!
- Sei por alto. Contou-me que andou metido com a Carla e que ela descobriu tudo. Disse-me ainda que ela descobriu no dia em que ele ia acabar tudo com a Carla.
-Dessa parte não sei mas digo-te se ele está transtornado então a Rosa nem te passa, nem parecia ela quando cheguei lá a casa.
- Pode ser que estes ares lhes façam bem! Isto não mudou nadinha Mi! Por mim ficava já aqui no fim de semana contigo! - João deu uma ligeira sapatada no rabo da mulher e piscou-lhe o olho, lembrando outros tempos em que passavam o fim de semana à lareira nas noites frias de inverno em Cerveira.
-   Vá deixa-te disso, eu vou ficar cá de certeza agora tu vais levar o Miguel de volta ao Porto, ela vai correr com ele num minuto. É possível que passes o fim de semana sem mim, mas lembra-te... eu SEI de tudo!! - Maria fez uma voz cavernosa, tentando "intimidar" o marido e sorriu.- Olha eu não te disse? O Miguel já lá vem, está na minha hora vou voltar para a beira da Maria, quanto a ti... juizinho sim?!
-Claro mi, podes ficar tranquila. - João beijou rosa levemente e atirou com um- antes de ir dás-me só o número da Carla por favor?

Maria piscou o olho ao marido e encaminhou-se a passos largos para casa. Rosa devia estar a precisar dela naquele momento.
Na casa principal Rosa estava sentada no sofá. A noite adivinhava-se fresca e Rosa estava completamente gelada. O telemóvel estava na mão, estava tentada a ligar à Carla. Queria saber até onde ia a lata da traidora, estava apenas à espera de Maria para a aconselhar.

-Então? Foi rápida a conversa.
-Sim. Não tenho muito para lhe dizer.
- Foi o João que o trouxe. Ele foi ter lá a casa e estava tão desnorteado que o João achou por bem trazê-lo, não fosse ele ainda ter um acidente.
- Fez mal. Se tivesse era a maneira de terminar o casamento sem dar muito a conhecer às pessoas.
- Não digas atrocidades Rosa. Bem sabes que não pensas nada disso.
- Pois não que não penso... Dei-lhe o fim de semana para escolher, ou sai ele de casa ou saio eu. Ele pode ir para a casa da Carla, eu é que é pior, voltar para casa dos meus pais não é solução.
- Ele não vai voltar para a Carla. Segundo o João iam acabar tudo hoje, foi isso que ele foi lá fazer.
- Sim ele também veio com essa desculpa. E ainda me queria dizer que em parte eu também era culpada porque pressionava o menino a ter um filho.
-A Sério? Ele disse-te isso?
- Pois disse. Enfim. Veio com o rabo entre as pernas, nem sabia o que havia de dizer.
- Quanto à Carla o que vais fazer?
- Vou ligar-lhe. Estava mesmo a pensar fazer isso quando chegaste.
- Agora? Achas que te atende?
- Ai atende, ela tem lata para isso e para muito mais.
- Só vai servir para te chateares, ela não vale o esforço.
- Vou ligar ao meu irmão primeiro. No que depender de mim está fora da empresa dos meus pais. Não tem credibilidade nenhuma.
- Mas não a podem despedir por isso.
- Não te preocupes, não vai ser directamente por isso. Sempre andei com paninhos quentes para tapar a porcaria que fazia lá na empresa. Vou só mostrar o pano.
- Tu é que sabes, mas estás a misturar as coisas a meu ver. Fala com o teu irmão e ouve o que ele diz, mas não o faças hoje, é demasiado a quente.

Bateram à porta levemente, quem seria? Eles já tinham ido embora, Maria ouvi o carro a arrancar.
Maria levantou-se e abriu a porta. Um homem moreno, novo,  com uma camisa aos quadrados surgiu à porta.

- Boa noite, peço desculpa interromper. Sou filho do senhor Manuel, a minha mãe pediu-me para vir cá trazer esta bola de carne e confirmar se estava tudo bem. A Rosa não está?
- Está está, mas pediu-me para vir eu à porta, está com alguma dor de cabeça, deve ter sido da viagem.
- Certo. Vi o Miguel ir embora com o outro senhor, por isso queria também dizer que se precisarem de alguma coisa este fim de semana estou aqui com os meus pais por isso disponham. Sei que a Rosa tem medo de ficar cá sem o Miguel  mas diga por favor que sabemos que estão cá por isso estamos alerta. Qualquer problema é só dizer ok?
- Obrigada, não será necessário certamente.
- Adeus, as melhoras para a Rosa.

Maria fechou a porta. Que bela figura aquele homem tinha. Sorriu sozinha.

1 de abril de 2011

Perdoa-me

Miguel caminhava firme pelo caminho de pedras cuidadosamente varridas pelo caseiro, ladeado por belas granjas floridas. O aroma das flores e da fruta madura misturavam-se, dando um ar menos pesado ao ambiente que se adivinhava.
No alpendre a figura das duas amigas apresentava-se cada vez mais nítida. Rosa tinha a cabeça pousada no colo de Maria, sentia-se segura assim. Foi Maria quem primeiro avistou o marido da amiga.

-Temos companhia Rosa... E desta vez não é o tio Manuel. O teu marido é mais fino do que eu pensava, veio cá ter como um GPS, certinho.

Rosa levantou a cabeça conseguindo balbuciar apenas um "Chegou a hora".

- Que queres que faça amiga? Deixo-te com ele? Queres que fique? Queres que fique perto?
- O que tiver de ser será Maria. Estou calma. Os ares daqui dão-me clareza mental. Não te preocupes, se eu precisar grito.
-Bem, vou então apanhar umas uvas para a sobremesa e ver se o senhor Manuel sempre me dá uma garrafinha do novo.

Maria levantou-se deixando a amiga sentada no banco de madeira, a olhar para o infinito e com o coração prestes a saltar pela boca. Caminhava a passos largos em direcção a Miguel, cruzando com ele mesmo ao pé do canteiro das rosas que emanavam um intenso perfume. Cumprimentaram-se com uma discreta troca de olhares. 
Mal passou por ele pensou que estava em falta com o marido e de repente o seu telefone tocou, era ele.

-Estou? Maria? Nem vais acreditar mas... Estou aqui também!
-Aqui onde?
-Aqui em Cerveira! Estou atrás da casa azul! Anda cá ter que eu explico-te.
-Trouxeste o Miguel?
-Claro! Querias que o deixasse vir a conduzir feito maluco? Não chegava cá certamente. Vá, anda cá ter e conta-me tudo!

Miguel via Rosa cada vez mais nitidamente e isso assustava-o. Sentia o mal-estar da mulher aumentar a cada passa que dava, tendo-se aproximado apenas o suficiente para a ouvir e para se fazer ouvir. Sentia necessidade dessa "distância de segurança".

-Desculpa Rosa. Não sei que mais te posso dizer. Tens todos os motivos para não me querer ver mais à frente mas tenho de te pedir desculpa.
-Tens razão. Não quero ver-te mais à frente. Nem sei porque vieste cá.
-Acho que te devo uma explicação, para além do óbvio pedido de desculpas. 
-Não me parece que tenhas muito para explicar. Andas metido com a Carla, nossa madrinha de casamento. Foi bom?
- Tens direito de expor as coisas como quiseres. Não aconteceu há muito tempo, foi uma coisa recente, uma estupidez.
- Por mim... até podia durar desde o início do nosso casamento, para mim era igual ao litro, vale o mesmo.
- Mas não foi, sempre te respeitei. Só aconteceu no mês passado, quando tivemos aquela discussão.
- Não vás por aí. Daqui a nada estás a dizer que a culpa é minha por ser má esposa.
- Nunca to direi, sabes que não é o que sinto. Há só dois culpados nesta história e sou eu e a Carla, mais ninguém.
- O que a Carla me deve é entre mim e ela. Não tens de falar dela, não quero ouvir a tua versão da Carla. Não quero ouvir mais o nome dela vindo de ti. O meu negócio com ela é outro.
- Ok falemos de mim. Que posso eu fazer? Estou muito arrependido. Sei que não te interessa para nada mas o que fui fazer hoje a casa dela foi pôr um ponto final nesta estupidez.
-Sim, tens razão, não me interessa nada. Nada que digas agora me interessa.
- Falhei Rosa, falhei muito. Quero que saibas que foi uma loucura. Não pensei, aconteceu. Não tem desculpa. Sei que te magoei, sinto-me mal com isso.
- Não te sintas mal por mim, tens de te sentir mal por ti.
- E sinto Rosa. Sei que não tem desculpa mas a história de quereres engravidar deixou-me fora de mim, completamente retirado da minha realidade, não me sinto preparado para isso.
- Não tens de te preocupar quanto a isso. Agora não só não quero um filho teu como não te quero a ti. Essa é a desculpa mais estúpida que já ouvi.
- Não é desculpa Rosa. O que fiz não é desculpável e não me quero escusar atrás de explicações. O que vim aqui fazer foi pedir-te desculpa. Mais, foi pedir-te perdão.
- Está feito, podes voltar pelo mesmo caminho que vieste. Podes ir para o apartamento no fim-de-semana. É o tempo que tens para decidir se sais tu, ou saio eu. Acabou Miguel, se não te importas fecha o portão da propriedade quando saíres.

Rosa levantou-se do banco de madeira e encaminhou-se para a porta de casa, entrando sem olhar nunca para trás. No mesmo sítio ficou Miguel imóvel, à espera de um olhar, de um perdão, em vão.

31 de março de 2011

O caminho para Cerveira foi feito quase sempre em silêncio. João conhecia bem o caminho. Vários foram os fins de semana que passou lá com a mulher, era sem dúvida um sitio bonito.
O silêncio foi interrompido por Miguel.

-Que é que eu lhe vou dizer?
-Pois... Não sei. Nem sei como é que tens lata para lhe aparecer à frente, meu. Ainda é cedo, não achas?
-Tenho de a ver João. Não posso deixar de falar com ela. Se deixar de aparecer vai parecer que estou bem com a situação e não estou.
- Tu é que sabes. Eu tenho para mim que ela não vai querer ver-te à frente, se quisesse tinha ficado em casa.
- Pois, imagino que não, mas eu não posso deixar as coisas ficarem assim.
- Eu ainda não percebi é como é que isto foi acontecer logo com vocês. Sempre foste tolo pela Rosa, sempre vos imaginei velhinhos e juntos, sem problemas... E agora esta "bomba"... Ui se fosse com a minha mulher podes querer que eu não precisava de vir atrás dela. Ela própria se encarregava de me encontrar mas era para me matar, no mínimo. A mim e à outra. Quem tinha de se isolar era eu.
-Bem sabes que a Rosa é diferente da Maria. Espero realmente que ela esteja em Cerveira, se não estiver não faço ideia para onde possam ter ido.

A estrada para Cerveira não havia mudado nada. À chegada, a paisagem permanecia igual a todos os outros finais de Verão. No ar sentia-se o aroma das uvas prontas a serem pisadas nos muitos lagares da zona. A entrada na propriedade foi saudada como sempre pelo senhor Manuel.
O senhor Manuel era o caseiro simpático que acompanhara sempre a família e que tratava não só da casa de Rosa como das outras casas da propriedade, todas da sua família. Sempre de sorriso afável e de enxada na mão, recebeu-os como sempre.

-Olá menino! Estava a achar estranho deixarem vir só as mulheres passar cá o fim de semana. Não vinham mal mas... isto sabe sem é em família, não é? Menino Miguel tem de tratar bem a Rosinha, está tão branquinha que parece que até encolheu! É dessa vida que vocês levam sempre a correr lá na cidade! Isso nem lhes dá saúde! Faltam-lhes as cores cá do campo, do cheiro da terra. Fazem bem vir cá no fim de semana. Vou dizer à minha mulher para lhes ir lá a casa levar uma bola feita com carninha caseira, acabou de as fazer à pouco, regado com uma pinga do novo vão ver que saem daqui como se fossem outros.
-Não se incomode senhor Manuel não nos devemos demorar. Mas a minha mulher já está cá?
-Está menino, chegou cedo com a amiga. Ainda agora lá passei e vi-as no alpendre a descansar. É p'ro que está bom! Olhe vou andando que tenho os bichos à espera para recolher, não se demore também que breve vai-se o dia!
-Obrigada senhor Manuel, até logo.

Elas estavam lá. Menos mal. Assim estavam seguras.
João avançou a medo, dando assim mais uns minutos para o amigo pensar. Mas Miguel não pensava em nada. Ia fazer tudo por impulso. Já conseguiam ver a casa e as duas amigas afiguravam-se no alpendre, ao longe.

- Ok João. Obrigada mas agora é comigo, vai estacionando o carro que a partir daqui eu vou a pé.

Queria que o senhor Manuel tivesse razão. Queria que saíssem todos dali como novos. Desconfiava que não ia consegui-lo só com a bola de carne e a pinga do novo. Rezava para que sim.

30 de março de 2011

A procura

... Rosa ouvia a voz do marido e ficou muda. As lágrimas caíam-lhe silenciosas, abafadas pelo colo da amiga.

-Rosa eu sei que já sabes de tudo. Não és parva nenhuma. O Parvo fui eu! Perdoa-me por favor, dá-me pelo menos um minuto para me explicar. Ou então não me perdoes mas deixa-me falar contigo... Onde estás? Estás sozinha? Estou preocupado...
-Não estou sozinha, estou bem. - A voz saía-lhe mais firme do que alguma vez imaginara mas não pretendia alimentar o diálogo por isso desligou a chamada.
-Muito bem Rosa, de onde veio essa força? - Também Maria havia ficado surpreendida com o tom de voz da amiga - De onde vem essa força espero que haja muito mais.

     Rosa sorriu e também ela se sentiu bem melhor. Ouvir o marido implorar só tinha aumentado o seu repúdio. Não era esta a reacção que esperava dele. Sempre o tivera como uma pessoa determinada e que assume tudo o que faz independentemente das consequências.
    Miguel encheu o copo de whisky e gelo e rodava-o na mão enquanto pensava no que fazer e onde estaria a mulher. Será que ela tinha conseguido ser tão forte como parecia. A verdade é que Rosa o surpreendia a cada passo, desde o pormenor do bolo e a perspicácia da foto do ecrã de fundo passando pela forma firme como respondera ao telefone, esta era sem dúvida uma mulher diferente da sua. E com quem estaria ela? Seria verdade que não estava sozinha? Ela não ia directa para a casa dos pais certamente, não os iria querer alarmar. Só podia estar com a Maria a sua grande amiga.

-É isso! - pensou- Ela está na casa da Maria certamente. A casa dela é grande suficiente para acolher a Rosa e ela sempre se sentiu bem lá.

    Miguel pouso o copo intacto e saiu disparado em direcção a casa de Maria. Pelo caminho ponderou que ela não iria abrir-lhe a porta dadas as circunstâncias. Ou iria certamente mentir-lhe e dizer que a sua mulher não estava lá.
   Quando chegou lá foi o João, o marido de Maria que abriu a porta.

-Miguel?! Que surpresa! Não me digas que a minha mulher tinha combinado um jantar cá em casa e eu esqueci-me outra vez... Estou tramado! Na volta tinha de comprar vinho ou alguma coisa e não... -João só parou quando reparou na cara transtornada do amigo. - Não é nada disso pois não? A julgar pelo teu ar não é certamente pelo jantar que estás assim, muito menos por eu me ter esquecido dos ingredientes... Qué pasa meu?
- A minha mulher está aí? Diz-me a verdade por favor.
- Não Miguel. Nem a tua nem a minha. Aliás, agora que falas nisso, a esta hora ela já costuma aqui estar. Que aconteceu? Estás a deixar-me assustado...
-Faz-me um favor, liga à Maria e pergunta-lhe onde está. Não digas nada, pergunta-lhe só onde está, não digas que estou aqui.
- Preferia que me explicasses, não gosto de mentir à minha mulher meu. Ela tem tipo antenas, capta logo o que se passa parece bruxa! Eu ligo-lhe, mas não te garanto que ela não desconfie.

-Estou? Mi? Onde está amor? Não vens jantar?
- Desculpa, já te devia ter ligado. Estou com a Rosa. O Miguel fez porcaria da feia. Mas eu depois conto-te, olha não vou dormir a casa, não te preocupes está tudo bem comigo.
-Mas estás onde?
-Estou com a Rosa, estamos a hibernar, mal possa ligo-te, vou desligar.

-Estás com azar pá. Ela não me adiantou nada! Só me disse que fizeste asneira. Que andaste a tramar pá?
-Traí a Rosa e ela descobriu tudo. Descobriu no dia em que eu ia acabar com tudo com a outra. 
- Isso é azar meu mas também arriscaste.
-Mais do que pensas. Traí-a com a Carla!
-Quem? A ruiva que é amiga dela? Aquela toda maluca? 'Tás a Gozar!
-Essa.
-Ela nem faz o teu tipo! Tu é mais certinhas e ela é toda maluca, que te deu.
-Sei lá, olha vai-se a ver foi mesmo por isso. Por ser diferente da rotina. 
-Mas ela é amiga da tua mulher meu! Como é que ela conseguiu? E tu também! Estou parvo meu. Mas... E agora?
-Agora quero falar com a Rosa e não sei onde ela está. Olha vou-me meter no carro e vou a todos os sítios que me vier à cabeça. Fui.
-Ei onde vais? Nem penses, achas que te vou deixar sair daqui a conduzir assim? Tás todo maluco pá, ainda te espetas na primeira curva! Anda, tenho o meu carro fora da garagem eu levo-te onde quiseres. Mas já te aviso, para que conste à minha mulher, NÃO estou a tomar o teu partido! É que se não ainda sobra para mim!

Miguel sorriu e anuiu. Conhecia a mulher do amigo e sabia que ela não ia gostar de o ver associado a ele. Ambos entraram no carro e olharam um para o outro.

-Para onde pá? - inquiriu João.
-Para Cerveira. A Rosa adora Cerveira.

29 de março de 2011

Sentada no alpendre, Rosa estava aninhada no colo da sua amiga. Tudo parecia ainda um pesadelo, um sonho mau do qual não conseguia sair, e o pior é que a protagonista.
Que estaria Miguel a fazer naquela altura? Será que já foi a casa e viu o bolo estratégicamente colocado ao lado do computador? A Carla havia tido uma ideia boa, o bolo ia certamente chamar a atenção de miguel para o computador.
De repente o telemóvel de Rosa toca no seu bolso. Nem sabia que o tinha trazido consigo, tinha-o colocado no bolso ainda ligado após ter falado com a amiga a não mais o tirou. Rosa pegou no aparelho e no ecrã podia ver "amor", com a foto do marido atrás.

- Que faço Maria? Atendo? Que lhe digo?
- Atende. Mas não digas nada, deixa-o falar. Não lhe digas onde estás!
- Não consigo...
- Carrega na tecla e não digas nada.

Rosa carregou no botão mas ficou muda. As lágrimas caíam-lhe pela cara à medida que ouvia a voz do marido.

-Estou? Rosa... Temos de falar... Estou amor? Estás a ouvir-me? Por favor diz-me só alguma coisa para ouvir que estás bem.

Do outro lado só ouviu silêncio

28 de março de 2011

Miguel

Miguel estava na casa de Carla, ambos sentados na sala olhavam para o computador atordoados. Ele estava verdadeiramente em pânico. Só em pensar que a sua mulher havia descoberto tudo e daquela forma fazia-lhe encolher a alma.

- Que raio fui eu fazer Carla?! Pior, o que FOMOS fazer?
- E agora? O que vamos fazer? Tens ideias? Ela de parva tem pouco, certamente que já percebeu. Como é que eu não vi logo que não eras tu que me estavas a responder?
-Sinceramente isso agora não me interessa nada. A verdade é que a minha intenção era vir aqui pôr um ponto final nesta brincadeira toda. Foi para isso que vim cá hoje, logo hoje.
-Como? Vieste cá hoje para quê?
- É como ouviste Carla. Tudo isto foi um erro. Um erro de ambos, mas foi um erro.
- Agora vais fazer de mim a má da fita. Tenho a dizer-te que a tua mulherzinha nunca mais te vai querer ver à frente. Se bem a conheço, a esta hora está fechada em casa e já tratou de arrumar a tua malinha e mandá-la para casa dos teus pais. Ou, na melhor das hipóteses, vai mandá-la para aqui, já que certamente que descobriu também quem é a outra. A sua melhor e fiel amiga. - Carla usa um tom sarcástico que incomoda verdadeiramente Miguel.
- Vou-me embora, tenho de falar com a Rosa. Nem posso tão pouco pensar que ela descobriu que foi contigo que a traí, nunca lhe quis mal e isso é mau de mais.
-Agora estás a fazer o papel de Madalena arrependida?! Não penses que vais fazer de mim a má da fita. Tens muito mais a perder do que eu, muito mais Miguel. Até agora não pensaste no mal que estavas a fazer à Rosa, souberam-te bem os bons momentos, mas como ela descobriu estás a tentar colocar-me as culpas em cima, não é? Miguel, Miguel, neste momento em que perdeste tudo da parte da Rosa, lucravas mais em ter-me como aliada...

Miguel estava verdadeiramente tonto. Quem era aquela mulher? Que estava Carla a dizer?
Era verdade. Miguel nessa noite tinha como intenção pôr um ponto final naquele relacionamento que nem compreendia muito bem como havia começado. A Carla era uma mulher muito atraente e realmente os momentos de risco que passara ao lado dela tinham-lhe sabido bem, mas Rosa sempre seria a mulher da sua vida.
Estava verdadeiramente arrependido, sentia a terra a fugir-lhe dos pés. Tinha de falar com Rosa, faltava-lhe a coragem.
Em segundos e sem dirigir palavra a Carla, levantou-se e bateu com a porta, ia para casa, lá era o seu lugar, só lá ia ter noção verdadeira do que estava a acontecer.

Na garagem estava o carro de Rosa, ela devia estar em casa, queria mesmo que estivesse. Ao abrir a porta, o cheiro a bolo de chocolate ainda morno estava no ar, de repente uma sensação de bem estar e normalidade invadiu-lhe o coração. Só o silêncio fazia antever o pior. Chamou por Rosa, mas sem sucesso. Viu o computador ligado, com o bolo ao lado delicadamente cortado e instintivamente foi ver os ficheiros abertos.
Era mau de mais. Nem ele queria acreditar que a mulher tinha conseguido ler tudo aquilo. No fundo do ecrã, a foto das duas amigas fazia prever o pior. Rosa sabia mesmo tudo. 
Na casa tudo permanece intacto, como se nada se tivesse passado. Só falta Rosa. Miguel pensou o pior por momentos.

-Meu Deus...Será que ela fez alguma loucura? - As lágrimas caiam-lhe pela face e cada vez mais uma sensação muito próxima da loucura se apoderava dele. 
Apartir de agora iria agir  por impulso, só o coração lhe ia dizer o que fazer...  

27 de março de 2011

O que fazer

      Maria chegara a casa da sua amiga em tempo recorde. A voz que ouvira ao telefone sempre aos soluços nem parecia da sua amiga, podia sentir-lhe as lágrimas, a angústia a cada palavra, a cada silêncio, do outro lado do telefone. Aquela pergunta também a tinha deixado intrigada. Porque raio era tão importante descobrir que mulher tinha o nome de Pedro? Como é que ela não sabia que a Carla tinha Pedro no nome, Ela que sempre fora uma das suas confidentes. Maria tinha de descobrir definitivamente o que se passava com Rosa, iria descobri-lo muito em breve, por isso tocou à campainha do apartamento da amiga de forma insistente.
     Rosa não ouvia a campainha. Estava no computador a tentar descobrir mais peças de um puzzle que de tão macabro parecia surreal. Só voltou para a realidade quando a amiga quase deitava a porta abaixo, após um vizinho a ter deixado subir.
     A sua amiga estava irreconhecível, um farrapo. A cara inchada e a roupa molhada de tanto chorar adivinhavam o pior.

    - Rosa, meu Deus, o que aconteceu? Estás bem? Morreu alguém?
    - Morreu Maria. Morreu a minha relação, o meu casamento, acho que morreu tudo à minha volta.
    - Como? Não estou a perceber nada! Pára de chorar por um segundo por favor, só o suficiente para eu perceber o que raio se está a passar.

      Rosa encaminhou a amiga para o computador do marido e mostrou-lhe as mensagens. Mostrou-lhe ainda tudo o que mais havia descoberto. Todas as outras conversas de cariz muito pouco ortodoxo que ficaram gravadas na memória temporária do computador e que ele se havia esquecido de eliminar. Não havia réstia de dúvida, a outra era a Carla a sua amiga de sempre.
     Maria lia tudo chocada, sem saber o que dizer. Ela nunca consegui gostar muito de Carla, sempre o disse a Rosa, mas nem ela, sempre atenta aos detalhes e pormenores, conseguia prever uma coisa destas. Era sórdido de mais, e há quanto tempo duraria? Como tinha lata aquele mulherzinha, ia jantar lá a casa, iam às compras, partilhava pormenores sobre a relação e depois enfiava-se descaradamente na cama com o marido da melhor amiga...
    Enquanto Maria tentava pensar racionalmente, uma nova mensagem caiu no computador.

    - Parece que me enganei no destinatário, desculpe - podia ler-se no ecrã.

    Claro que nenhuma das duas acreditou naquela mensagem ridícula, entreolharam-se e por um segundo tiveram vontade de rir, muito. Como é que ambos podiam agora ser tão inocentes? Será que a inteligência de ambos não dava para mais? Será que pensavam que Rosa era assim tão tonta para acreditar naquele suposto engano?

     - Que faço Maria? Ajuda-me. Estou perdida. Não sei se vá casa dela e lhes parta tudo agora ou mais daqui a pouco. Não sei se lhe arrumo as malas já ou se mude a fechadura primeiro. Ajuda-me, pensa tu que eu não consigo, tudo o que me passa pela cabeça envolve violência e escândalos a sério, e tu sabes como odeio isso.  - Rosa neste momento odiava-se a ela própria por ter sido tão parva e ignorar todos os sinais, metendo uma cobra na sua casa, na sua vida.
    - Vais imprimir tudo o que descobriste,  e vamos já para a tua casa em Cerveira. O Miguel detesta aquilo não vai ter lata de aparecer por lá, e se aparecer vai sentir-se desconfortável como sempre. Com calma pensas melhor em tudo e esperas que ele diga alguma coisa. Vais pôr a cabeça no lugar e decidir o que fazer, apressa-te a colocar as coisas na mala porque em breve ele aparecerá cá em casa, como se nada fosse. Vai tentar desmentir, virar o jogo, se bem o conheço vai chamar-te paranóica e ludibriar-te com esquemas mal amanhados. Despacha-te. Neste momento é o melhor.

    Rosa percebeu que a amiga tinha razão. Além do mais não iria querer estar em casa quando o marido voltasse a casa e fizesse cara de quem não está a perceber nada. Vila Nova de Cerveira era sem dúvida o melhor local para pensar e, com a companhia de Maria ia ser mais fácil fazê-lo.
   A casa de Cerveira sempre esteve na família de Rosa. Uma casa simples mas muito confortável, totalmente remodelada com um alpendre lindo onde cheirava sempre a flores. Foi muito feliz naquela lugar, por isso quando os pais decidiram oferece-lhe a casa como presente de casamento ficou deliciada. Miguel nunca gostou. Dizia que os fins-de-semana tinham de ser aproveitados de forma diferente e a distância do Porto era a descupla apresentada pare evitar ir ao campo. Não é um rio, uns passaritos ou uma lareira que me vão fazer sair daqui, devias vender aquilo - dizia ele. Rosa jamais o faria
   Em momentos a mala ficou feita e quando deu por si estava no carro com a sua amiga, com as folhas impressas que documentavam o que marido andava a esconder nos últimos tempos.
   Em casa deixou o computador com todos os ficheiros descobertos abertos e como plano de fundo colocou uma foto dela e de Carla tirada num fim-de-semana na Serra da Estrela. Ao lado uma fatia do bolo de chocolate que o marido adorava e que tinha feito horas antes.
     Qual seria a reacção do marido quando visse que Rosa havia descoberto bem mais do que ele imaginava? Que iria fazer? Iria ligar-lhe? E ela como ia reagir?




26 de março de 2011

A descoberta

Rosa não queria acreditar quando as mensagens instantâneas começaram a cair no ecrã do computador do seu marido.

-Ainda demoras muito amor? Não me digas que a sonsa da tua mulher ainda te está a empatar a uma hora destas!

Rosa gelou mas decidiu responder. Como se fosse o seu marido, começou a estabelecer um diálogo.

-Não, desta vez não é ela. Estou aqui preso por um e-mail que me enviaram agora do escritório e é urgente, tenho de dar resposta até que feche a bolsa em Nova Iorque. Prometo que não me demoro.
-Já sabes que estou à tua espera. Vê lá, a mim não precisas de dar as desculpas que dás à Rosinha Tontinha. Não perguntas o que trago vestido? Ou melhor o que não trago?

Rosa não sabia o que responder, estava mesmo a ser traída. Mas quem seria aquela mulher? Seria do escritório? No ecrã aparecia o nome Pedro. Precisava saber mais, ia arriscar.

- Estou mesmo atrapalhado com o relatório e só em pensar em ti não consigo dar resposta... Estás a desconcentrar-me, como sempre.
- Já sabes que não gosto de ti sério, nem concentrado. Isso é bom para a tua Rosinha sonsinha e "sériazinha"... Ainda demoras? Vais chegar tarde, assim já só chegas à sobremesa.
- Agora é a minha mulher que está aqui a lixar-me a cabeça. Um dia passo-me e digo-lhe estou farto de ti, vou para a beira da Pedro. - Rosa jogou a única carta que tinha. Não conhecia nenhuma mulher com o nome Pedro e, tinha certamente pouco tempo, uma vez que Miguel já havia saído de casa há algum tempo. Podia ser desmascarada a qualquer momento-.
-Pedro? Nunca me chamaste Pedro.
- É o nome que coloco para despistar.
- Realmente a Rosa nunca se ia lembrar disso. Confia em ti cegamente, 'tadinha da Rosinha. Mas ela não ia associar, acho que nem sabe que esse é o meu nome do meio. Olha, estão a bater à porta deve ser o jantar que encomendei, vê se te despachas, deixa uma sandezinha feita para a rosinha comer sozinha e anda para a minha beirinha.

Era ele. Rosa sabia que ia ser descoberta naquele momento e que o seu marido havia chegado à casa da outra, por isso esperou. Deixou-se ficar online para ver no que dava.
Definitvamente era alguém que ela conhecia. Mas quem? Apelido do meio Pedro? A sua cabeça estava a mil. Ligou a Maria. Maria sempre soube o nome de toda a gente, sempre foi boa nisso ao contrário de Rosa que não decorava nomes de ninguém.

-Estou Maria?
-Rosa? Que se passa? Que voz é essa?
- Rápido, conheces alguém cujo apelido do meio seja Pedro? Uma mulher.
- Pedro... Pedro... Assim de repente só me lembro da tua amiga Carla. Ela deve ter Pedro no nome, pelo menos o irmão dela que trabalha lá no banco também tem Pedro no apelido. Mas porquê?....
Estou?... Rosa? Estás a assustar-me... Rosa...

Rosa já não ouvia a sua amiga. Como era possível nunca ter reparado. A Carla, sua amiga desde os tempos de liceu, que esteve sempre lá em casa em todos os momentos, madrinha do seu casamento... 
Rosa não sabia o que pensar, não pensava. A sua cabeça estava vazia, assim como o seu coração. O seu marido tinha um caso com uma das suas melhores amigas e ela nunca tinha desconfiado nem por um segundo. Naquele momento o tempo parou e ela nem se apercebeu que Maria tinha ficado tão preocupada que se metera no carro e em breve batia à sua porta...  

A relação

Miguel era o namorado se sempre. Era o amor desde os tempos do liceu que resistiu à faculdade e que culminou num casamento lindo após 8 anos de namoro. 
Naquela tarde no alpendre, Rosa recordava a altura em que se conheceram numa festa de adolescentes. Logo que o viu, Rosa sabia que haveria de ser aquele o homem da sua vida, o pai dos seus filhos. Até então nunca tinha acreditado nessas coisas do amor à primeira vista. 
Com o passar dos anos, ambos cresceram, amadureceram e conseguiram ambos carreiras sólidas, e cada vez mais Rosa estava certa das suas convicções iniciais, logo que o conheceu numa tarde quente de fim de Setembro.
A sensação que invadiu Rosa foi ainda pior. Foi numa tarde como aquela que havia conhecido o Miguel. Foi numa tarde assim que, em tempos, soube que o amor havia finalmente batido à porta, e de uma forma arrebatadora. Agora, anos volvidos, as  suas certezas caíam por terra.
O Miguel era bonito. Sempre o fora. Os olhos esverdeados e a tez morena em conjunto com o cabelo sempre estrategicamente desalinhado faziam dele um homem verdadeiramente atraente. Os anos passaram por ele de forma generosa, deixando-lhe de prenda um charme natural e irresistível. Andava sempre bem cuidado, bem vestido e com uma aparência digna de suscitar o interesse de qualquer pessoa. Era definitivamente um homem interessante.
Rosa sempre soube que o seu marido suscitava o interesse também por parte das mulheres que o rodeavam. Sempre assim foi. A verdade é que ele nunca lhe havia dado qualquer motivo para desconfiar de nada. Nunca foi D. Juan e a relação deles sempre foi pautada por uma estabilidade e união avassaladoras. As amigas costumavam dizer que ele era imune aos flirts e investidas que se pudessem fazer, e Rosa sempre foi obrigada a concordar e, por isso mesmo, nunca foi ciumenta.

-Sempre pensei que fosse possível ele ter um "deslize" com alguma das secretárias lá da firma, ou mesmo com uma cliente, mas nunca, em tempo algum, poderia tão pouco sonhar com este pesadelo. É sórdido de mais Maria, não sei o que pensar.
- Também eu estou chocada, também nunca pensei que ele fosse capaz de uma vida assim, quase dupla.  Mas tu vais ter de ser forte.

A noite passada foi de tormento. O seu computador estava avariado e não conseguia ter acesso ao ficheiro demasiado extenso que lhe tinham mandado para o e-mail, por isso decidiu usar o computador do marido e resolver temporariamente o problema. Felizmente ele havia deixado o seu computador ligado quando saiu à pressa para o encontro com um cliente.
Rapidamente aquilo que parecia uma sorte virou pesadelo. De repente tinha alguém a falar consigo por mensagens instantâneas, perguntando se o seu amor demorava muito...

A noite ia ser longa, os momentos seguintes prometiam. Deve haver algum engano, rezou.

25 de março de 2011

Desmoronar

Setembro ia quente.
Apesar do fim de tarde solarengo que convida à preguiça Rosa nunca se sentira tão fria.
O seu coração estava gelado e nem a presença da sua amiga de sempre, Maria, a ajudava naquele momento.
Rosa é uma mulher de sucesso. O seu emprego numa multinacional, onde detém um cargo de chefia, e o seu casamento de quatro anos com o seu amor de sempre assim a levavam a pensar.
A brisa quente daquela tarde de Outono traz lembranças de momentos felizes. Ainda ontem a vida parecia perfeita e de repente tudo mudou.
O alpendre da casa de campo é o lugar ideal para fugir a uma realidade que sabe que, mais tarde ou mais cedo, terá de aceitar.

- Como é que ele me conseguiu fazer uma coisa destas, Maria? Como? Nós tínhamos tudo!

As lágrimas caíam-lhe pela face enquanto aguardava a resposta da amiga que tardava em surgir. Maria olhava a amiga em silêncio enquanto pensava como lhe deveria dizer que há muito suspeitava que o seu casamento vivia alimentado num só sentido. 

- Pensei sempre que já desconfiavas Rosa. 
- Como assim? Achas que se pensasse que o meu marido andava metido com uma galdéria qualquer não tinha já feito alguma coisa? Mas... porquê isso agora? Tu já sabias? Maria... Tu sabias e não me disseste?!
- Calma Rosa. Eu não sabia de nada. Pelo menos não em concreto. Mas desde há algum tempo para cá, o Miguel tem agido de forma estranha connosco. Evita jantares em conjunto, fica incomodado quando o tema da conversa são os affairs de alguém conhecido, passava imenso tempo distante e com o telemóvel sempre na mão. O trabalho não lhe ocupa tanto tempo assim.

Roso ouve a amiga e reporta-se para as noites em que o marido chegava exausto a casa, a horas tardias sempre culpando o trabalho e as horas extra que o chefe o obrigava a fazer no escritório ou as reuniões com clientes estrangeiros.
Aqueles períodos de ausência de uma ou duas semanas faziam agora todo o sentido...

24 de março de 2011

As amoras e o amor

As amoras são como o amor.
Nascem sem ninguém as plantar e quase sempre onde não se quer.
São sazonais e por vezes despontam do arbusto mais feio e desagradável.
O seu aroma é inconfundivel nos fins de tarde quentes do início de Outono.
Mas as amoras não precisam de cuidados, não precisam de cultivo nem de adubo, muito menos de terra fértil para surgir.
Afinal quem disse que as amoras são como o amor?! Fiquem para ver.