No tempo das amoras tudo pode acontecer.

3 de março de 2012

Ao rodar a fechadura da porta de entrada Rosa tentava perceber se o marido estaria em casa ou não. Miguel dava sempre uma volta apenas, ela dava sempre três. Ele costumava reclamar com o excesso de zelo e ela com a sua despreocupação. Sorriu, e entrou. Miguel tinha pasta de trabalho no sofá e a porta do quarto estava aberta. 
Rosa entrou no quarto com a calma possível, que era mais do que a que esperava ter. O marido estava a retirar a roupa do armário com as malas de viagem abertas em cima da cama.
-Tem calma Rosa, estou só a fazer a mala, queria ter vindo mais cedo mas a tarde foi demasiado complicada e não consegui.
- Tudo bem. Não estou a dizer nada. 
- Tive de ir prestar declarações sobre o incêndio. 
- Também tenho de ir lá amanhã.
- Pensava até que já lá tinhas ido, sabiam tudo sobre a a nossa vida. 
Miguel falava sem desviar o olhar e enquanto metia a roupa dobrada nas malas de forma calma e meticulosa, o deixou Rosa bastante apreensiva. O marido estava com um conformismo anormal para a situação.
- Não, vou só amanhã. O que te perguntaram? Foram muito incisivos? Ainda me parece estranho que tenha sido fogo posto.
- Nunca fui interrogado antes, mas pelas perguntas que faziam acho que desconfiam de mim. Perguntaram qual o regime do nosso casamento, se estávamos a pensar no divórcio a curto prazo, como estávamos em termos de finanças, com quem te tinha traído, se a mulher com quem te tinha traído lucraria com o incêndio, olha sei lá. Conseguiram-me fazer mais perguntas sobre a porcaria da relação do que tu. 
- Parece-me bem.
-Parece-te bem Rosa? Achas que alguma vez eu fazia uma coisa daquelas? Além do mais eu estive sempre com o João. Pelo menos nele devias confiar.
- Não preciso disso Miguel. Não me parece que fosses capaz de uma coisa dessas. Mas também não te achava capaz de ires para a cama com a Carla e foste.
- Não confundas as coisas Rosa. Mesmo isso que aconteceu foi um erro que nem eu sei como arranjei a cometer. Mas estás no teu direito de pensar o que quiseres. Eu vou só terminar isto e depois venho com mais tempo buscar as coisas de Inverno.    
- Como quiseres. Vais para onde?
Miguel levantou subitamente a cabeça, estranhando a pergunta da mulher.
- Isso interessa-te mesmo?
- Não. Estou só a fazer conversa.
- Não precisas de fazer conversa. Vou para o Ipanema durante estes próximos dias, já falei com o Manuel da  imobiliária para me arranjar qualquer coisa para alugar. Ele prometeu ser breve.
-Ok.
Nesse mesmo ano tinham resolvido ir comemorar o dia dos namorados ao Hotel Ipanema. Tinham adorado o programa romântico. Nunca  ligaram muito ao dia dos namorados mas nesse ano, um amigo e cliente ofereceu-lhes um voucher para um programa que iria existir no hotel nesse dia e resolveram aproveitar. Rosa lembrou-se disso e quase não se conteve. Resolveu sair do quarto sem dizer mais nada. 

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